A viagem para a
morte do cronista social Carlos Castro é recriada em Crime, cuja primeira
apresentação acontece esta quarta-feira. Bruno Horta viu o filme e conversou
com o realizador.
Quando o
trailer começou a circular na internet, em meados de Dezembro, choveram
críticas à estética do filme, alegadamente pouco profissional. “É-me difícil
criticar um filme sem o ver, mas admito que haja pessoas para quem isso não
seja importante”, ironiza o realizador, Rui Filipe Torres. Finalmente,
esta quarta-feira, dia 7, na Cinemateca Portuguesa, detractores ou entusiastas
poderão ver na íntegra o filme de que tanto se fala.
Crime parte do caso real
de homicídio do cronista social Carlos Castro, aos 65 anos, a 7 de Janeiro de
2011 num hotel de Nova Iorque. A sessão está marcada para as 21.30 e o bilhete
custa 3,20 euros.
O argumento, da
autoria do realizador, adapta uma peça de teatro escrita pelo actor João
D’Ávila, que teve uma leitura encenada em 2011, na Sociedade de Língua
Portuguesa. As personagens não têm os nomes das pessoas reais envolvidas no
caso. Não há um Carlos Castro e um Renato Seabra (jovem modelo que matou o
cronista e acabou condenado a 25 anos de prisão nos EUA). No filme, há um
António (João D’Ávila) e um Rodrigo (Ruben Garcia).
“Para João D’Ávila,
a peça é influenciada pelo fim trágico de Carlos Castro, até porque eram amigos”,
explica o realizador, de 55 anos. “Mas para mim o filme é mais do que isso, o
que me interessou não foi a morte de uma pessoa concreta, mas aquilo que há de
universal na situação”, conta Rui Filipe Torres.
Ainda sem data
de estreia comercial, Crime leva pela primeira vez ao grande ecrã uma versão do
caso Carlos Castro. “Filmámos em condições-limite”, revela o autor. “Sem
orçamento, abaixo de todas as condições necessárias, foi tudo feito em nove
noites, em Abril de 2014. Decidimos que, mesmo assim, valia a pena avançar.”
As duas personagens
aparecem num quarto de hotel em vésperas de uma viagem a Nova Iorque. Um crescendo
de tensão entre António e Rodrigo culmina no assassinato daquele – o que mais
um vez difere dos acontecimentos reais, pois Castro foi morto em Nova Iorque e
não em Lisboa.
De um lado, um
homem envelhecido, apaixonado por um rapaz muito mais novo. Anseia estar em Nova
Iorque para a lua-de-mel de ambos e declara: “A ilusão é muito mais importante
do que tu pensas, aliás, a ilusão é a realidade”. Do outro lado, um rapaz muito
mais novo com sonhos de fama e reconhecimento, a rejeitar as investidas
amorosas do outro. “O que é que podes dar-me, além desse teu corpo envelhecido?
Viagens, fantasia, mariquices!”
Para o
realizador, trata-se “fundamentalmente de um trabalho de dádiva dos actores à
câmara”. É um jogo psicológico de insultos mútuos, um jogo de poderes
simbólicos embrulhado em paixão e obsessão, oportunismo e ingenuidade,
chantagem e rejeição, verdade e simulacro.
[uma versão deste texto saiu na Time Out Lisboa de 17 de Dezembro de 2014, p. 64]