segunda-feira, 23 de outubro de 2006

Sócrates e a manipulação

Dirigentes do Partido Socialista, não identificados, ligaram este domingo a vários jornalistas para os impelir à cobertura de uma conferência de imprensa de militantes socialistas da CGTP. A notícia consta num artigo de opinião do jornalista Luciano Alvarez, hoje, no Público. Reproduz-se na íntegra, porque os artigos da edição online do jornal deixam de estar disponíveis para acesso livre dias depois da publicação.

Jornalistas de vários órgãos de comunicação social receberam ontem, por volta da hora de almoço, telefonemas de agitados dirigentes socialistas para anunciar um "assunto urgente" (assim foi "vendido" ao PÚBLICO). Nada mais, nada menos que uma conferência de imprensa "da corrente socialista da CGTP".
Ou seja, a meia-dúzia de militantes socialistas inscritos na CGTP manifestava-se não contra a luta da central pelas medidas governativas, mas pela forma como o PCP estará, dentro da CGTP, a manobrar a referida luta. Uma ninharia, mas suficiente para agitar o PS de Sócrates, que viu na coisa uma espécie de cisão grave na CGTP.
O ênfase do PS em promover esta iniciativa revela, porém, que os socialistas parecem ter entrado num estranho estado de desnorte, como o provam os dias horribilis do primeiro-ministro e do executivo - que tem vindo a cometer gaffes, erros, avanços e recuos uns atrás dos outros. Só no fim-de-semana somam-se mais dois: o suposto engano no aumento de 112,4 por cento no ordenado do ministro Pedro Silva Pereira (Presidência), que até ontem ninguém sabia explicar, e o anúncio feito por Correia de Campos (Saúde) de que os doentes que sofrem de patologias graves vão poder tomar os medicamentos nas farmácias e não apenas nos hospitais, o que deixou a Ordem dos Médicos à beira de um ataque de nervos.
Não é com fragilidades, desnorte, erros, avanços e recuos que se credibiliza um discurso reformista e que, tal como afirmou José Sócrates na noite de sábado, se convence os portugueses que o país "tem um rumo e uma orientação". Até porque começa a ficar a ideia que o primeiro-ministro não tem uma equipa suficientemente forte no Governo para levar por diante tais reformas.
Pior: a sequência de episódios dos últimos dias começa a ter algumas semelhanças com as trapalhadas de Santana Lopes.
Luciano Alvarez, "Público", 23 de Outubro de 2006