domingo, 25 de março de 2012

Tem visto OVNIs por Lisboa?



Dezenas juntam-se num hotel para ouvir falar de ETs. Será uma tendência na cidade? Nos últimos meses houve três reuniões do género. Bruno Horta faz a crónica da mais recente. Ilustração de Luis Levy Lima.

Acreditar é a palavra de ordem. “Esta sexta-feira, na estrada Porto-Guimarães, apareceu um OVNI com quinas”, relata o homem que promove o encontro, Luís Aparício, da Associação de Pesquisa OVNI. “Estava a uns 700 metros de altura e foi visto por uma rapariga de 14 anos. Pelo que ela me contou, há ali princípios de abdução [rapto], porque ficou sem o período.” Isto começa bem.

São seis da tarde de sábado, dia 3 de Março. Há 30 almas reunidas numa sala alcatifada do Hotel Príncipe Lisboa, na Avenida Duque d’Ávila. Luís Aparício só quis deixar aquele breve apontamento, como que para criar ambiente. Retira-se depressa para a plateia e dá protagonismo ao convidado desta semana: Francisco Mourão Corrêa, do Instituto Português de Exopolítica. Tem uns 40 anos e sotaque do Norte. Usa fato, gravata e suspensórios. Liga o portátil Toshiba a um projector de vídeo, instala-se com grande à-vontade e começa a sua apresentação em Powerpoint.
Francisco estuda a forma como os terráqueos devem estabelecer relações diplomáticas com extraterrestres. Quem nos representa perante eles, com que legitimidade, em que termos? Sim, porque os extraterrestres existem de certeza, já estão entre nós e já comunicam com os militares americanos.

“O que venho dizer não é a verdade”, começa por dizer. “É uma versão de acontecimentos, baseia-se em relatos. Ainda não existem as provas que todos procuramos.”

A declaração de transparência parece sensata, mas a plateia, claramente, não precisa dela para nada. Há homens e mulheres de todas as idades. Ao canto, uma mulher com o filho de sete ou oito anos. Eles acreditam. E as crenças costumam dispensar a lógica.

Por vezes, o convidado é interrompido pela assistência. “Claro que eles aparecem mais a partir de Setembro, e depois em Março. Porquê? Por causa do equinócio, como toda a gente sabe”, apregoa um homem desgrenhado, com sotaque brasileiro e óculos esverdeados. Assíduo destes encontros, não restam dúvidas. “Mas esse autor já comunicou com seres de Andrómeda”, nota uma outra voz enérgica. E depressa se percebe que para estas pessoas discos voadores e extraterrestres são uma e a mesma coisa.

Querem mostrar que sabem muito, que dominam o assunto, que têm a lição na ponta da língua. É definitivamente um encontro para consumo interno. De entusiastas para entusiastas.

De repente, é como se tivéssemos regressado àquele Verão de 1995 em que a autópsia do extraterrestre de Roswell foi apresentada por José Rodrigues dos Santos no Canal 1. As fantasias cósmicas voltam a ser reais. “Isto deve-se ao encontro de 1954 entre a Administração americana e uma comitiva extraterrestre”, assegura Francisco. “Billy Meier costumava ter encontros com mulheres ET e chegou a contactar com a neta de uma ET que o tinha raptado muitos anos antes”, acrescenta. E depois dá-nos a cereja no topo do bolo: “Há raças extraterrestres benévolas, como os reptilianos e os annunaki. E raças malévolas, que cooperam com os militares: são os telosianos e pleiadianos, entre outros.” Levanta-se voo e não se quer voltar à aborrecida realidade.

[publicado na revista Time Out Lisboa de 21 de Março de 2012, pág. 11]