"Bateram casualmente os meus olhos na primeira página do Público de dia 23, e apressei-me a folheá-lo para, lendo a reportagem produzida por Teresa de Sousa sobre o "Reencontro histórico" protagonizado por Soares e Carlucci, confirmar algumas das suspeitas que mantenho sobre o chamado "Verão quente de 75" e o papel por ambos desempenhado durante aquele "ano de brasa" do período revolucionário ("o sempre saudoso PREC", como sempre dizia o nosso querido Zeca Afonso) que os portugueses viveram após o 25 de Abril 74.
Para lá de algumas confirmações obtidas, uma claras, outras, lidas nas entrelinhas, a reforçarem a tese que publicamente tenho expendido sobre quem, o porquê e o como do fim da "revolução socialista" acontecido em 25 de Novembro 75, conduziu-me a leitura da reportagem à necessidade de remeter esta carta com vista à reposição da verdade, já que, parafraseando Soares, que aprecia os americanos porque eles "gostam que lhes digam a verdade", tenho a impressão muito nítida de que os portugueses também disso gostam, motivo que me leva a apreciá-los muito e a não desejar, também por isso, que eles sejam enganados com falsas declarações.
Assim, contrariando as fantasiosas reminiscências dos dois gerontes produzidas perante a jornalista, afirmo categoricamente:
1 - Nunca conheci pessoalmente Frank Carlucci.
2 - Portanto, nunca almocei com Frank Carlucci.
3 - Nunca pedi a Frank Carlucci a sua morada em Lisboa e nunca mandei "alguns soldados " para fazer a sua segurança a seu pedido.
4 - A única vez em que falei com Frank Carlucci foi em 11 de Março de 75, quando fez uma chamada telefónica para o Copcon, que eu comandava, no rescaldo dos acontecimentos, para me perguntar se era verdade eu ter afirmado a uma estação de rádio de Lisboa ser minha convicção que o novo embaixador americano em Portugal era um homem da CIA e que alguma coisa teria que ver com a tentativa de golpe militar que tinha acabado de se verificar e que fora rapidamente jugulado por forças militares sob o comando do Copcon. Afirmações que não só ratifiquei como ainda acrescentei que, pessoalmente, o considerava persona non grata em Portugal e que, se fosse primeiro-ministro, lhe daria um prazo de 24 horas para ele abandonar o meu país. Considerações que me pareceram, então, francamente agastá-lo e que a mim me deram a satisfação do desabafo.
Otelo Saraiva de Carvalho
Lisboa