sexta-feira, 6 de outubro de 2006

Nada a declarar

OPINIÃO
Está disponível a edição de Novembro da Vanity Fair. A capa já aparece no site oficial, embora os conteúdos que aí constam sejam ainda os do número de Outubro. O destaque principal desta revista de esquerda é o actor George Clooney (um perigoso esquerdista segundo o comentador e mega-estrela da Fox News Bill O'Reilly). Mas o que parece ter mais interesse, pela raridade, é o que a discreta chamada de capa no canto inferior direito anuncia: o último manuscrito perdido de Truman Capote. Será que a Vanity Fair publica o manuscrito ou conta apenas a história desse desaparecimento? Ou será que se trata de outra coisa qualquer? Logo se verá, quando, com o atraso do costume, a revista chegar às bancas portuguesas.

A propósito, Amália Rodrigues morreu há sete anos. A 6 de Outubro de 1999. Morreu e parece que depois disso nunca mais os portugueses viram o fado como dantes. Apareceu uma Mariza e as coisas mudaram, modernizaram-se, democratizaram-se. Amália morreu há sete anos e Truman Capote morreu há 26. Números, quer num caso, quer no outro, pouco redondos. Diz-se, e a prática confirma-o, que à imprensa só interessam efemérides redondas. Os decénios, os vinténios, os quartos de séculos, os séculos, por aí fora. O mais, não costuma ser recordado.

A consulta da edição de sexta-feira de vários jornais portugueses com versões
online
confirma essa tese. Nenhum se lembrou de Amália. E até haveria o que dizer. Parece que a Câmara Municipal de Santa Comba Dão, contou o Sol na semana passada, quer criar um Museu Oliveira Salazar e entre o espólio consta um postal que a fadista lhe enviou. Que postal é esse? Está inédito? É um com quadras da sua autoria, de que ela fala na biografia de Pavão dos Santos? A relação Amália/Estado Novo é tão comentada quanto desconhecida.
Pelos vistos, para os americanos, mesmo que um artista, como Capote, tenha morrido há "x" anos pouco redondos, vale sempre a pena dar-lhe uma capa de uma revista dita superficial quando há coisas novas a dizer sobre ele.
Para os portugueses, não.