quarta-feira, 12 de setembro de 2007

Na cama com os escritores

Na revista "Pública" de 9 de Setembro. Excerto:

Posou para a Playboy porque precisava de dinheiro e queria ser uma escritora famosa. Dormiu com James Dean e Hugh Hefner e descobriu com Simone de Bouvoir que as mulheres podiam ser livres. Os loucos anos 50 da americana Alice Denhan, contados na primeira pessoa.

Chega a Nova Iorque com 18 anos e um namorado de ocasião. Em 1951. Entra com desembaraço nos cocktails e na cama de escritores em ascensão. Deseja o mesmo que eles: muito sexo, nenhum compromisso e o nome na história da literatura. Um nome ainda mais brilhante que o dos três grandes: Hemingway, prestes a receber o Nobel; Fitzgerald, já morto, portanto um mito; e Faulkner, rival declarado do primeiro, Nobel em 1949. É alta, bonita e magra. Tem longos cabelos ruivos, olhos muito verdes, busto 38.

Nesta época, os romancistas rivalizam com os actores de Hollywood em riqueza e glória. Escrever é o sonho de qualquer homem e o que a faz correr a ela. É por isso que foge de casa dos pais e se refugia na grande cidade. Quer tornar-se cosmopolita. Espera que a tirania da América provinciana, onde nasceu, a deixe finalmente em paz. Esquece-se, no entanto, de que é apenas uma mulher. E as mulheres deste tempo só nascem para casar e ter filhos.

Meio século depois, Alice Denham [na foto], de 75 anos, decidiu revelar o que lhe custou querer o que queria. Escreveu Sleeping With Bad Boys (Na Cama Com Os Malandros, em tradução livre), um livro de memórias, alegadamente isento de ficção, publicado há poucos meses e sem tradução portuguesa prevista. Trezentas páginas, 34 capítulos – o mote para uma conversa telefónica com a autora.

O suplemento literário do New York Times resumiu a obra desta forma: “É sobre um tempo em que, na prática, a mulher tinha duas hipóteses: ser bem-comportada ou malcomportada. As bem-comportadas ficavam com a aliança, os filhos e a casa. As malcomportadas ficavam com o resto”. Denham seguiu, obviamente, a segunda hipótese. “Quando cheguei a Nova Iorque, com uma licenciatura, pensei que seria fácil arranjar emprego, mas nem para trabalhos de secretária me marcavam entrevistas, porque eu não sabia escrever depressa”, recorda. “As mulheres eram completamente descriminadas”. Num cerrado sotaque do Sul dos EUA, acrescenta: “Todos os escritores famosos daquela época, alguns muito bons, eram homens. Eles eram deuses e as mulheres deveriam estar ali apenas para os aplaudir. Eu queria ser escritora e uma mulher independente, porque sempre foi essa a minha maneira de ser”.

Nascida numa família falida de origem aristocrata, em Jacksonville, na Florida, impôs-se através da beleza física – contra a vontade da mãe, descrita como uma mulher muito severa. O pai seria sempre mais brando. Tornou-se modelo (pin-up). Fez anúncios de electrodomésticos. Foi rainha de um circo. Posou para revistas masculinas. A Playboy foi o auge, como se verá. Ao que diz, queria apenas ganhar visibilidade e dinheiro para um dia se dedicar inteiramente à escrita. Mas pouco conseguiu. Passava a vida nas festas que o escritor Norman Mailer e a mulher, Adele, organizavam e que acabavam, invariavelmente, em bebedeira e discussão. Dançava em casa para manter a forma física. Entretinha-se a rascunhar contos e romances e a tentar, sem êxito, vendê-los aos editores. “Nos anos 50 e 60, Nova Iorque era o centro das artes, tinha uma vida cultural muito forte, tal como Paris tinha tido nos anos 20”, refere. Bruno Horta