domingo, 16 de agosto de 2009

Ler não chega

"Pelo meio surgem cafés que já não existem, tertúlias propícias ao excesso e à “noivadiagem”, iniciações à arte tipográfica em que Paulo da Costa Domingos (sobretudo nas décadas de 80 e 90) se tornou o nosso miglior fabbro e um dos mais inventivos editores europeus. A receita, simples mas ao alcance de poucos, é-nos dada de forma inequívoca: “Manter um vigilante e apertado nexo entre qualquer significado estético e os seus modos de produção e difusão — disto nunca se deve abrir mão.” Aí está uma máxima, severamente livre, que não encontraremos nos reinantes concubinatos editoriais ou em delirantes planos nacionais de leitura. Passa por aqui, num tom austero mas contundente, uma outra ética: “A leitura faz de nós melhores pessoas; [...] isso consolidou em mim o autodidacta.” Congruentemente, a figura do intelectual ou do funcionário poético é alvo de extrema corrosão. Aos “consumidores de ideias feitas” e à “escumalha da crítica e do jornalismo”, Paulo da Costa Domingos contrapõe, sem rodeios, que “ler não chega; há que ver e ouvir pela abertura do coração, comovidamente”."
[crítica de Manuel de Freitas ao livro Narrativa, de Paulo da Costa Domingos, no Expresso ("Actual"), ontem; sem ligação]