segunda-feira, 7 de maio de 2012

"Tudo se resolve ou adia numa linguagem hipócrita"

Reinventar Portugal

vários autores

Ed. Estampa, 2012
Reinventar Portugal é um conjunto de ensaios sobre o futuro de Portugal perante a crise económica, financeira, política e social que vivemos. 

João Carlos Alvim, o editor, ele próprio autor de um dos ensaios, convidou Alexandre Franco de Sá (professor de filosofia na Faculdade de Letras de Lisboa); António Carlos Carvalho (jornalista e documentarista); Carlos Fragateiro (professor na Universidade de Aveiro); Diana Andringa (jornalista e documentarista); Fernando H. Lopes da Silva (médico); Joana Lopes (professora de filosofia na Faculdade de Letras de Lisboa); João Freire (sociólogo); José Adelino Maltez (professor no ISCSP); Maria do Carmo Vieira (professora do ensino secundário); Miguel Cardina (historiador); e Paulo Côrte-Real (professor de Economia e presidente da ILGA).

Se o interesse despertado por cada texto é irregular, também a qualidade literária o é. Podem passar-se vários parágrafos sem que se encontre uma ideia nova, viva e vibrante, dita de maneira eficaz, cativante, esperta.

Não é, ainda assim, um livro chato. Acrescenta saber e faz pensar.

Curiosamente, é de João Carlos Alvim um dos textos que mais me interessaram. Intitula-se "Um Lugar Como Outro Qualquer". Excertos da página 113:

Por razões seguramente complexas, não temos sido capazes de assumir olhos nos olhos, com meridiana clareza, as nossas divergências. Tudo se resolve ou adia numa linguagem alusiva, seráfica e hipócrita como poucas, a que alguns chamam consenso democrático. [...]

[Uma das condições para ultrapassarmos a crise] consiste em não menosprezar os nossos concidadãos, quaisquer que eles sejam, por se considerar que eles não pensam ou não agem consoante outros grupos mais próximos das supostas elites desejariam. O modo como muitas vezes se olha para os rurais, ou para os católicos, como se criticam as classes médias que hoje clamam por ordem e segurança, ou finalmente como se vêem todos aqueles que não chegam a querer ser tão livres e inovadores como o desejariam alguns de nós, e só ambicionam uma existência rotineira e desprovida de problemas - tudo isto indica uma democracia doente [...]."
Este último parágrafo dá que pensar à luz do recente episódio de consumo desenfreado nas lojas Pingo Doce (aqui).