«A WISE é um fórum mundial para discutir os problemas da educação e serve, ao mesmo tempo, para demonstrar o poder económico e simbólico do Qatar, um dos países mais prósperos do Golfo Pérsico e dos poucos que passaram incólumes a Primavera Árabe.
A capital do país, Doha, é
uma cidade de arranha-céus espelhados e longas avenidas com palmeiras.
Com o dinheiro do petróleo e do gás natural tudo está em permanente
construção e mudança, de tal modo que as gruas e as máquinas da
construção civil fazem parte integrante da paisagem. É nesta cidade que
fica sedeada a Al Jazeera, a CNN do mundo árabe, com emissões em várias
línguas e centros de produção espalhados pelo mundo. Aqui, também, foram
construídas réplicas, não em termos arquitectónicos mas de currículo,
de faculdades da Universidade de Georgetown, da Carnegie Mellon e da
University College de Londes, entre outras, sob a designação comum
Universidade Hamad bin Khalifa – o que permite à elite árabe estudar sem
sair do Médio Oriente.
O nome da universidade deve-se ao do emir
do Qatar, xeique Hamad bin Khalifa al-Thani, de 60 anos (o país é
dominado pela família al-Thani desde o fim do século XIX). Uma das três
mulheres do emir, Moza Bint Nasser, é a figura mais carismática do
regime, bastante ocidentalizada nos modos e no visual. Usa véu islâmico e
salto agulha, aparenta frequentes tratamentos estéticos, fala
fluentemente inglês e não demonstra em público os sinais de submissão
muitas vezes associados ao género feminino no mundo islâmico. Ela
preside à Fundação Qatar e tem vindo a estabelecer-se como filantropa de
projectos educativos, razão pela qual, além de enviada especial da
UNESCO para o ensino básico e superior, acaba de lançar a iniciativa
Educate a Child, dirigida a crianças refugiadas de África.
O país dos al-Thani é uma autocracia que se tornou independente do Reino Unido em 1971 e desde então nunca teve eleições. Apesar do liberalismo económico, existe uma forte estratificação social. Os imigrantes da Índia e do Paquistão constituem 36% de uma população total de cerca de dois milhões, de acordo com a base de dados online CIA World Factbook. Além de exercerem os trabalhos mais mal remunerados, os imigrantes asiáticos têm poucas oportunidades de mobilidade social. Um cidadão do Bangladesh, que estuda gestão e trabalha como motorista em Doha, disse ao PÚBLICO que é fácil entrar numa universidade do Qatar, desde que se seja bom aluno, mas o mercado de trabalho só tem lugar para europeus e qataris, pelo que no fim do curso o futuro dele terá de ser noutro país.»
[Público, 8 de Dezembro de 2012, original aqui]