sábado, 8 de dezembro de 2012

O ensino precisa de dinheiro e deve falar mais com o mercado de trabalho


«A WISE é um fórum mundial para discutir os problemas da educação e serve, ao mesmo tempo, para demonstrar o poder económico e simbólico do Qatar, um dos países mais prósperos do Golfo Pérsico e dos poucos que passaram incólumes a Primavera Árabe.
A capital do país, Doha, é uma cidade de arranha-céus espelhados e longas avenidas com palmeiras. Com o dinheiro do petróleo e do gás natural tudo está em permanente construção e mudança, de tal modo que as gruas e as máquinas da construção civil fazem parte integrante da paisagem. É nesta cidade que fica sedeada a Al Jazeera, a CNN do mundo árabe, com emissões em várias línguas e centros de produção espalhados pelo mundo. Aqui, também, foram construídas réplicas, não em termos arquitectónicos mas de currículo, de faculdades da Universidade de Georgetown, da Carnegie Mellon e da University College de Londes, entre outras, sob a designação comum Universidade Hamad bin Khalifa – o que permite à elite árabe estudar sem sair do Médio Oriente.
O nome da universidade deve-se ao do emir do Qatar, xeique Hamad bin Khalifa al-Thani, de 60 anos (o país é dominado pela família al-Thani desde o fim do século XIX). Uma das três mulheres do emir, Moza Bint Nasser, é a figura mais carismática do regime, bastante ocidentalizada nos modos e no visual. Usa véu islâmico e salto agulha, aparenta frequentes tratamentos estéticos, fala fluentemente inglês e não demonstra em público os sinais de submissão muitas vezes associados ao género feminino no mundo islâmico. Ela preside à Fundação Qatar e tem vindo a estabelecer-se como filantropa de projectos educativos, razão pela qual, além de enviada especial da UNESCO para o ensino básico e superior, acaba de lançar a iniciativa Educate a Child, dirigida a crianças refugiadas de África.

O país dos al-Thani é uma autocracia que se tornou independente do Reino Unido em 1971 e desde então nunca teve eleições. Apesar do liberalismo económico, existe uma forte estratificação social. Os imigrantes da Índia e do Paquistão constituem 36% de uma população total de cerca de dois milhões, de acordo com a base de dados online CIA World Factbook. Além de exercerem os trabalhos mais mal remunerados, os imigrantes asiáticos têm poucas oportunidades de mobilidade social. Um cidadão do Bangladesh, que estuda gestão e trabalha como motorista em Doha, disse ao PÚBLICO que é fácil entrar numa universidade do Qatar, desde que se seja bom aluno, mas o mercado de trabalho só tem lugar para europeus e qataris, pelo que no fim do curso o futuro dele terá de ser noutro país.»
[Público, 8 de Dezembro de 2012, original aqui]