terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

Literatura gay como nunca ninguém a viu




O primeiro dicionário de literatura LGBT portuguesa é uma ideia da editora Índex. Electrónico e gratuito, escreve Bruno Horta.

O que é um livro ou um filme gay? Há peças de teatro gay? Porque é que um bar frequentado por todo o tipo de pessoas deve ser considerado gay? O que é gay não é para todos? Se é para todos, para quê chamar-lhe gay? São estas perguntas sem resposta definitiva que circulam com mais ou menos frequência pela redacção da Time Out Lisboa.

Pois parece que o dilema não é só nosso e acaba de fazer novas vítimas. São eles João Máximo e Luís Chainho, coordenadores do novo Dicionário de Literatura Gay e responsáveis pela editora que o dá à estampa, Índex Ebooks – primeira editora portuguesa de literatura LGBT em formato digital, fundada em Março de 2012.

O dicionário, descrito por João Máximo como “o primeiro do género em português, tanto quanto se saiba”, começa a ser publicado já na próxima segunda-feira, 24. Electrónico e gratuito, pode ser descarregado através das lojas online Amazon, Google Play e Apple e no site de impressão a pedido (print on demand) Lulu.com. É projecto para durar cerca de um ano. Ao longo dos próximos meses vão saindo fascículos que correspondem às letras do alfabeto.

Para já, sai o tomo da letra “A”. Começa com A Alma Trocada, de Rosa Lobato Faria, e vai até Aula de Poesia, de Eduardo Pitta. Foi este primeiro volume que a Time Out já leu numa versão provisória. Nele aparecem livros como A Vida de Horácio, de José António Almeida; Antinous, de Fernando Pessoa; ou Agradece o Beijo, de Ana Zanatti; e notas biográficas de Ary dos Santos ou Al Berto.

Nas primeiras páginas surge um aviso que demonstra a dificuldade dos coordenadores na escolha do conteúdo. “A inclusão de um autor, editor, livreiro, ou qualquer outra pessoa, não tem qualquer significado em relação à sua orientação sexual. O único critério para inclusão de autores ou outros prende-se com a sua contribuição para a literatura gay”, lê-se.

João Máximo explica à Time Out que o objectivo do aviso é o de “evitar causar melindre”. E dá um exemplo. “Há uma entrada para António Lobo Antunes, por causa do livro Que Farei Quando Tudo Arde? Ele não é um autor de literatura gay, mas aquela obra  é de temática gay.”

O mesmo responsável nota que ele e os colaboradores do projecto, cuja lista final de nomes está por fechar, não são académicos nem especialistas em literatura. “Não temos a veleidade de fazer uma análise literária profunda, por isso é que se trata de um dicionário e não de uma enciclopédia. Limitámo-nos a elencar referências, não estamos a fazer crítica ou estudos comparados”, afirma. “O objectivo é ter uma lista exaustiva: tudo quanto soubermos e conseguirmos apurar, entra.”

Com capa inspirada numa serigrafia de Salvador Dalí, o dicionário junta algumas ideias e sugestões recolhidas através de um fórum que os editores criaram em 2012 no site GoodReads. Pela primeira vez, sob a forma de fichas de leitura, junta-se informação dispersa que pode ser útil a quem acompanha a temática LGBT. A grafia escolhida é a do Acordo Ortográfico de 1990.

Há citações e hiperligações de diversas fontes, uma das quais a Time Out Lisboa (por iniciativa dos organizadores), e são apenas referidos autores de língua portuguesa publicados em Portugal. “Limitámos o âmbito, porque não temos acesso a especialistas que nos dêem informações sobre tudo o que sai nos países de língua portuguesa”, justifica João Máximo. “O critério principal é o interesse que certos livros ou autores têm para a comunidade LGBT. A fronteira não é fácil de definir, haverá sempre lugar a grandes debates”, conclui.
[texto publicado na Time Out Lisboa de 19 de Fevereiro de 2014, pp. 64]

terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

“É importante erotizar corpos velhos e gordos”


Quem é o desconhecido do lago? Talvez seja Henri, o homem gordo de meia-idade que se senta à beira da água e espera que a vida mude sozinha. Ou Franck, o jovem que procura sexo anónimo no bosque junto ao lago. Ou então Michel, um críptico corpo sexual que todos namoram. Talvez seja, enfim, o morto que aparece a boiar, segredo de polichinelo nesta história. Ou se calhar não é nenhum deles.






[excerto da entrevista publicada na Time Out Lisboa de 20 de Novembro de 2013, pp. 64-65]