Tem um texto [no livro "Século Passado", a editar em breve] sobre o 25 de Novembro no qual conta um episódio de desconfiança em relação à política partidária.
Vi nascer alguns partidos. O que me interessou sempre foi a hipótese de os movimentos populares ultrapassarem os partidários. Gosto do que está a nascer, do impulso irreflectido, das primeiras peças, das primeiras ocupações de terras. Das segundas não gostei, porque já era o Partido Comunista a organizar o imenso movimento espontâneo... Interessa-me que o desejo possa irromper na rua, de uma forma comunitária e partilhada.
E ainda vota?
Voto sempre, mas não fico contente. As eleições de Lisboa ainda me fazem engulho.
Não tem partido escolhido?
Não, e a evolução do Bloco de Esquerda é algo que me entristece, embora muitas das causas me possam ser próximas. Não gosto da arrogância de dizer «a maioria dos católicos votou» ou «entrámos finalmente na Europa». Há nisto um oportunismo.
A política está livre desse oportunismo?
Não. Por isso, gosto dos movimentos pendulares.
Interessou-lhe algum movimento pendular nos últimos tempos?
A greve dos liceais em França.
E em Portugal?
Em Portugal, confesso que não estou interessado em mais nada. Interessei-me e achei lindíssima a última campanha de Mário Soares. Votei nele com o maior entusiasmo e não posso deixar de estar com esta pessoa que teima, insiste em ser político, tem coisas para dizer e continua a surpreender-me com a sua liberdade de pensamento. Foi o último grito do Rei Lear.