segunda-feira, 1 de janeiro de 2007

Antes da hora do pânico

Na "Pública" de 31 de Dezembro de 2006.

A profecia, antes de tudo: “à medida que o fumo se adensa no teatro global, brilha cada vez mais o sinal de Saída. Mesmo que ainda não tenhamos visto esse sinal de Saída, a hora do pânico está mesmo atrás de nós”.

Bruce Sterling, 52 anos, norte-americano. Há duas décadas, fez publicar “Mirrorshades”, livro de contos e ensaios sobre a cultura cyberpunk. Hoje dedica-se a falar e a escrever sobre meios de comunicação e design. Um futurólogo, que até faz parte do catálogo da gigantesca editora Random House.

É ele o oráculo nas primeiras páginas do livro “Worldchanging”, publicado no início de Novembro nos EUA. Subtítulo: guia do utilizador para o século XXI. A editora, Harry N. Abrams, diz que estão à venda cem mil exemplares e que até ao momento ainda não recebeu qualquer pedido de editoras portuguesas interessadas na tradução.

O livro é “praticamente uma enciclopédia dos sinais de Saída” (a maiúscula consta no original inglês) para a crise mundial, garante Sterling, ao mesmo tempo que elogia a numerosa equipa que o escreveu: “estas pessoas não são comissárias políticas. Debatem-se claramente com ideias e assuntos quase inimagináveis”.

O prefácio, brevíssimo, é de Al Gore. Tal como o antigo vice-presidente democrata americano, Sterling é apenas uma estrela convidada para credibilizar o todo. Os textos são pequenos, carregados de referências bibliográficas, espalhados por 600 páginas com cores diferentes, consoante o tema tratado, e acompanhados por fotografias, algumas de grande formato. Expõem problemas ambientais, políticos, sociais e tecnológicos e dão conselhos práticos sobre como os ultrapassar. Obra colectiva.

Os currículos dos 62 autores estão lá. Gente desconhecida do grande público: músicos, designers, físicos, jornalistas, escritores, engenheiros, etnógrafos, entre outros. Sobressai o ecologista Alex Steffen, coordenador da obra e do blog com o mesmo título, um dos mais populares sobre temas ambientais, criado há três anos. Stefffen (há 224 mil entradas para o nome dele no Google.com) vive em Washington e, segundo a Wikipedia.org, criou este livro com base no “The Whole Earth Catalog”, publicado anualmente entre 1968 e 1998, onde predominavam a ecologia e a chamada contracultura.

As linhas de acção propostas espalham-se por áreas como o consumo privado (aconselha-se a compra de roupa de algodão orgânico e não de algodão convencional, pois este resulta de processos agrícolas que empregam enorme quantidade de pesticidas, que se infiltram no solo e atingem os recursos aquíferos), o optimismo, aplicado aos movimentos sociais de contestação (“a História atesta que se se mostrar às pessoas um futuro melhor, consegue-se construir movimentos que mudem o mundo”) ou os negócios (por tópicos, dizem-nos como reconhecer a seriedade da propaganda comercial).

Num capítulo dedicado à política é curioso o incentivo ao chamado “citizen journalism” na Internet, ou, como já se diz em português, jornalismo participativo: colaboração estreita entre profissionais e amadores. “Além de poderem dizer [através da Internet] o que os media mais conhecidos nunca publicariam ou difundiriam, os jornalistas podem trabalhar à sua vontade, livres de tutelas, de Relações Públicas e da habitual passividade da maioria dos jornalistas próximos dos militares”, lê-se.

A editora diz que o papel usado na impressão do livro é amigo do ambiente, porque 100 por cento reciclado e livre de cloro.

B.H.